segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Altamiro não é gay!


        Dizem que o juiz que casa a gente é o juiz de paz. Que paz, meus amigos, que paz, pergunto-lhes chacoalhando as mãos para o alto?!?!?
        Há dois anos comprei um canário, o primeiro de uma série de dois, a quem dei o sugestivo nome de Altamiro (se você não entendeu, criatura cósmica singular, azar o seu, que está perdendo boa música...). Altamiro me foi vendido como um canário novinho, filhote, mas macho. "Chiquitito pero cumpridor!", prometera o dono da loja. Como paguei preço de fêmea, tudo bem: se não cantasse, ia acabar pondo ovos. Enfim, ou o caboclinho usava o gogó ou o fiofó. Mas tinha que cantar, que foi comprado pra isso.
        Porém o tempo passava e o rapaz nada. Uns arrulhos aqui, uns gorjeios mal-acabados ali, e nada de entoar como o nome demanda. Comecei a olhá-lo de beirada, admirando-lhe apenas outras qualidades, que dia desses descreverei com pormenores, e a sua metódica vontade de tomar banho! Sim, senhoras e senhores, o pássaro fazia questão de tomar banho todos os dias e com água limpa, que ele não é de Araraquara.
        Mas o que importa é que certa vez, ao mexerem nas gaiolas em dia de limpeza doméstica, Altamiro fora colocado ao lado do já falecido Cauby, esse sim um vozeirão de barítono italiano, e de Gonçalves, canário também muito bom que ganhei da nossa antiga secretária do lar. Gonçalves e Cauby passaram (sim, os pássaros passaram) a se estranhar, peitando-se nas paredes das gaiolas como chimangos e maragatos.
        Espantada, a doutora dos olhos lindos de Valinhos resolve dar uma de bióloga e se lança aos testes: coloca o Gonçalves perto do Altamiro e paz; coloca o Cauby perto do Altamiro e paz; coloca o Gonçalves perto do Cauby e briga. Taxativa, conclui a meretíssima: "Esse Altamiro é gay!"
        Incauta! O que não faz uma mulher para perturbar um homem, não é verdade? É capaz até de se casar com ele!
        Pois bem, o desafio estava lançado. Cartas na mesa, armas escolhidas, restava-me renitir: "Calma aí, mulher, que o bicho é novo ainda. Do jeito que gorjeia, qualquer dia canta, que fêmea não faz nem isso." Mas o quê? A dona da pensão insistia e fazia questão de dar publicidade à sentença: "Esse Altamiro é gay!".
        Entre os humanos, pouco se me dá que a azêmula claudique. Entre os humanos sabemos que uma fêmea, e até mesmo um homem assim meio fêmea, pode jogar futebol, carregar pianos, governar a cidade de São Paulo, cantar, dançar, compor, pregar botões, casar com o Ronaldo, e ninguém tem nada com isso, que o que interessa é o serviço pronto e bem feito; mas entre canários a coisa muda de figura: se for fêmea não canta e fim de papo!
        O fato é que o tempo foi passando, o jiló foi sendo consumido e eu quase juntando o safado do canário pelos colarinhos, até que um dia... Altamiro resolve soltar a voz! Que beleeeza!, como diz sempre o Milton Leite. No melhor estilo, com requintes, floreios e falsetes, o amarelinho agora flauteia seu canto e enche a varanda, o jardim e os ouvidos da minha incrédula, boquiaberta e estupefata esposa, fazendo-a quase dobrar os joelhos e clamar chorosa pelo meu perdão.
        "Está perdoada", aviso soberbo.
        "Esse cara é besta", resmunga ela aqui ao lado...

Vicente Estevam Júnior
"Cerveja é a prova de que Deus nos ama e quer que sejamos felizes!" (Benjamin Franklin)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

“Lúcia Veríssimo”


        Ele acordou, ou pareceu acordar, com um incômodo barulho de “moto-serra” na sua cabeça... – “Maldita ressaca...” – pensou ele...
        Acordou, mas não conseguia abrir os olhos...aliás, preferia não abri-los...os efeitos do álcool eram sentidos... aliás, não eram sentidos...parecia sem os sentidos...só sabia que estava acordado por causa daquele maldito barulho de “moto-serra”...
        Parecia ter dormido por horas, ou pior... parecia não ter dormido... ou pior ainda !!!! Sentia seu corpo dormente, ou não sentia seu corpo !! Apenas o barulho da “moto-serra” e um burburinho ao fundo...
        Pior de tudo é que não se lembrava de ter bebido tanto assim...
        Foi a uma festa, ele e a namorada. Aniversário de um amigo de infância... tinha muita cerveja !! Mas muita mesmo... mas como resolveu “dar uns cortes” numa “Lúcia Veríssimo” (cachaça boa bagaray !!) comprada especialmente para a ocasião, resolveu ficar na manha. Bebeu, pelo que podia lembrar, uma meia dúzia de latinhas... pouco pelo que ele e seus amigos estavam acostumados. A cada lata, um “trago” de cachaça!
        Ao final da festa sua namorada, chata como sempre ficava em todo fim de festa, insistiu para conduzir o carro. Ela sempre insistia...
“Nem fodendo !!!! Sabe aquela história de mulher no volante, perigo constante ?? Acredite, é real...” disse ele. E aquela noite então, desnecessário...bebeu pouco...
Mas continuava sem entender o que era aquele barulho de “moto-serra”. Queria se coçar, mas por alguma razão não conseguia... Tentou abrir os olhos e viu tudo turvo... bagunçado...
“Devo estar sonhando ainda...” – pensou.
De repente sentiu alguém batendo em sua cara...tapas fortes, seguidos de berros... como se uma pessoa ordenasse a ele algo que não compreendia...
O que era turvo foi clareando... percebeu o perfil de um homem usando boné... mas o que fazia ele no seu quarto, na sua casa ??
E o barulho da “moto-serra” passou a ficar ensurdecedor... e a coceira que sentiu começou a se transformar em dor... sua cabeça tombou para o lado...
Havia uma moça... rosto familiar, parecida até com sua namorada...mas era impossível... não lembra de terem dormido juntos...aliás, não lembra sequer de ter chegado em casa !!! E o que via a seu lado era um rosto, “sangrado”, como que “explodido” !!! Mas aqueles cabelos....
E o homem de boné parou de estapeá-lo... e parou de gritar também... e sussurrando, como que em confissão, disse:
“Campeão... conseguimos livrar seu corpo das ferragens do automóvel...”
O campeão desmaiou naquele momento.....
E nunca mais acordou...
Nunca mais...


Ian McMorrison

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Trânsito é coisa muito séria !!


        A criança ainda é muito jovem. Qualquer coisa entre cinco e seis anos. Nesta idade, as crianças sequer foram alfabetizadas. Uma das poucas certezas que elas têm é de que o sinal vermelho é feito para “parar”, o amarelo é “atenção” e o verde significa “seguir”. É uma das primeiras coisas que as crianças aprendem. Essa lição simples traz, intrínseca, uma série de padrões morais que nortearão a formação do caráter do ainda jovem ser humano. Sim, eu disse “formação do caráter”. Respeito a regras, a normas.
        Voltemos a nossa jovem criança do início do parágrafo anterior. Ao final da aula na escolinha, aonde a “tia” reforçou o significado destas cores em “atividades lúdicas”, ela volta pra casa. Seu pai abriu uma exceção na sua atribulada agenda e fez uma surpresa ao filho. Foi buscá-lo, de carro, na porta do colégio. Já próximo de casa, ao se aproximar de um semáforo, reduz a marcha do seu veículo, olha nos retrovisores se tem alguém “olhando” e, como não observa ninguém, passa o sinal vermelho.
        A criança, ao perceber que o seu pai não agiu como a “tia” ensinou, incontinente grita:
        “Papai, você passou o sinal vermelho !! Você tinha que parar !!!!”
        A resposta do pai ??
        “O pai pode filhão...fica tranquilo...”
        ...
        No final daquela semana, a mesma criança vai a uma festa da família. Desta vez vão no carro além da criança e do seu pai, a mãe. Após a festa, o Pai que tomou “meia dúzia de cervejas” e vem agüentando o “chororô” do filho – a “tia” ensinou que se beber cerveja não pode dirigir – assume a direção do veículo para voltar pra casa. Ao se aproximar do mesmo semáforo desrespeitado dias atrás, ele reduz a marcha do veículo, olha nos retrovisores se tem alguém “olhando” e, de novo, como não observa ninguém, passa o sinal vermelho. A criança, de novo, chama a atenção do pai:
        “Papai, você passou o sinal vermelho de novo !!!!”
        A resposta do pai ??
        “Não tem ninguém olhando filhão...além do que, já ta muito tarde pra gente parar no semáforo...”
        ...
        Nestes dois exemplos, o pai transmitiu três lições ao filho, ainda em idade de “formação do caráter”.
1.    O Pai, o cara que deveria ser exemplo e que é o nosso primeiro herói, pode sim desrespeitar qualquer regra e norma;
2.    Se não tiver ninguém olhando, podemos fazer coisa errada que não seremos punidos;
3.    Temos hora para cumprir a lei, e hora em que podemos transgredí-la.
...
As cenas acima são familiares a você ??
Infelizmente estes exemplos são mais comuns do que deveriam...
Assim são educadas as nossas crianças. Duvido que a maioria de vocês que está lendo este texto não tenha feito parte, pessoalmente, de uma situação destas descritas acima. E se não fez parte, o que admiro, conhece alguém, ou alguma família em que as situações se enquadram perfeitamente.
Eduquei meu filho obrigando-o a atravessar na faixa de pedestre. Desde pequeno condicionei-o a procurar uma destas faixas e atravessar a rua de forma segura.
Hoje com dezesseis anos, não são raras as vezes em que seus amigos caem na gargalhada quando ele resolve andar dez metros a mais para atravessar na faixa.
Ele está errado e seus amigos estão certos ??
Claro que não...
...
Estatísticas “otimistas” contam 30.000 mortos no trânsito por ano no Brasil. Isso significa 82 mortos por dia. Ou 3 mortos por hora.
Um ser humano morre a cada vinte minutos no Brasil vítima de acidente de trânsito.
Não vou contabilizar os amputados ou para(tetra)plégicos.
Todos nós conhecemos alguém que perdeu um parente em acidente de trânsito.
Até quando você vai tratar o assunto de forma irresponsável ??
Até quando você vai tolerar essa “deformação de caráter” ??
A gente volta a se conversar...

@alexbernardo_

domingo, 21 de agosto de 2011

“A Árvore da Vida”



        Existem alguns termos que me causam náuseas. “Filme de Arte” é um deles. Usam-no sempre para designar filmes em que o crítico assistiu, gostou, mas graças à arrogância intrínseca a atividade de “crítico”, acredita que o público não entenderá o filme. Aí então ele chama de “Filme de Arte”.
        O público, ou a maioria esmagadora dele, quando lê em uma crítica que tal filme é um “Filme de Arte”, já torce a boca e procura um passatempo de mais fácil digestão intelectual. O consequente baixo público garante o status de cult ao filme e o privilégio do crítico. Aí ele sai fazendo citações ao filme em outras críticas pelo resto da vida. E também garante a si, o epíteto de intelectual do cinema.
        Parto do princípio que todo filme é uma “Obra de Arte” e, por essa razão, consideramos o cinema como a nossa Sétima Arte. Claro, existem obras de arte ruins e outras - poucas, raras - maravilhosas...mas são todas “Obras de Arte”.
        “A Árvore da Vida” é uma dessas “Obras de Arte” !!
        É um filme difícil...tenso...denso...!!
        E é aí que dou a você a primeira dica:
        Não é um filme para ser “assistido”...é necessário que você se deixe levar, permita que o filme te conduza... É um filme que atinge não só a visão, mas também a audição. O filho de um amigo meu disse que o filme é “progressivo”, comparando o filme a um disco do Marrs Volta, longo, repleto de solos, alternando ritmos de condução e codas intermeando as músicas. Eu discordo, sutilmente... É psicodélico, com momentos que beiram uma experiência lisérgica !!
        Se você for esperando assistir um “filme de Brad Pitt”, não vá... é capaz de sair da sala de projeção como tantos que, além de não entenderem nada daquelas mais de duas horas de projeção, sentem vergonha de falar que não gostaram... mesmo não gostando, sabem que estão diante de uma “obra de arte”.
        Terrence Malick é um diretor bissexto. Nos seus quarenta anos de carreira, mais do que tenho eu de vida, dirigiu apenas cinco filmes. A melhor coisa que posso falar dele é que se 5% dos diretores de cinema da atualidade tivessem a sua capacidade de encontrar belos enquadramentos, o cinema seria muito mais legal. O cara é muito talentoso !! Malick é da mesma linha de diretores do genial Stanley Kubrick a quem, diga-se de passagem, ele é sempre comparado. Até a reclusão e a atitude de filmar o quê, quando e quanto quer nos remete a ele.
E claro, ele não se faz de rogado. Malick “homenageia” Kubrick escancaradamente.
        Aliás, “A Árvore da Vida” só é comparável a “2001 – Uma Odisséia no Espaço”.
        O fato de o diretor ser formado em filosofia em Harvard e lecionado a matéria no MIT nos dá uma sugestão do que teremos pela frente. “A Árvore da Vida” é um grande questionamento sobre...a vida !! E sobre Deus !! E sobre as perguntas básicas que geraram toda a nossa filosofia:
        Quem somos ?
        De onde viemos ?
        Para onde vamos ?
        No momento de maior questionamento – Deus sabe de todas as coisas, mas será que sabe da “minha” existência !? – Malick nos joga em uma enorme seqüência progressivo/psicodélica que nos coloca no bigbang e nos leva aos dias de hoje. Esse é o momento da rendição do expectador. Há uma passagem, que não vou detalhar, que envolve dinossauros. A cena é ainda mais perfeita do que os ofertados por Spielberg em seus Parques de Dinossauros. E até os dinossauros tinham sentimentos...
        Lindo... Emocionante !!!!
        Como disse, muita gente vai assistir ao filme por causa de Brad Pitt e Sean Penn. Não cometam este erro. A presença deles é mero detalhe. O filme não tem roteiro, quase não tem diálogos – os personagens falam em off quase todo o filme. Não tem uma montagem linear. É atemporal, em todos os sentidos.
        Pitt é afogado pela interpretação brilhante do garoto Hunter McCracken, o Sean Penn criança. Já Sean Penn é enfeite de belos cenários. Está ali, acredito, apenas pelo sofrimento que sua expressão transmite naturalmente. Jéssica Chastain representa a mulher de Pitt. Sua atuação é um deslumbre...
        Não posso concluir esse texto sem elogiar a trilha sonora – Alexandre Desplat - e a belíssima fotografia – Emmanuel Lubezki.
        Merecidamente, levou a Palma de Ouro em Cannes.
        E agora você está se perguntando:
        Ta bom “Falando”... você falou um monte de coisa aí e tal mas... do que o filme trata afinal ??
        Não vou falar...
        É um filme obrigatório !! A gente se desacostumou a pensar cinematograficamente, né ?? É isso !! “A Árvore da Vida” é um exercício cinematográfico...
        Não é assim, chegar aqui e dizer que gostei...
        Ou não gostei...
        É pra chegar aqui e dizer que já assisti três vezes !!
        E, já que prolongaram o período de sua exibição, irei mais uma vez hoje.
        #RECOMENDO

        Falando de Santos

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Questionamentos sobre os novos tempos


Esse nosso novo mundo globalizado (esse papo-furado de novo?!?! Pois é...) nos traz uma gama de novos produtos, versáteis, tecnologicamente avançadíssimos, inteligentes, blá, blá, blá... mas é impressionante como inventam coisas das quais não precisamos. Celular que faz um monte de coisa, mas que às vezes não consegue fazer uma ligação, carros que têm cara de fora-de-estrada, mas que é só maquiagem porque a suspensão do danado é igual a de um carro popular... e por aí vai.
Hoje estava eu a passear com meu pequenino, quando resolvi beber uma cervejinha enquanto estavam terminando de lavar meu carro (que é popular e tem suspensão de carro popular. Complicado, né? Mas isso não vem ao caso...). O moleque dormindo, a cervejinha aberta ali... resolvi pegar uma batatinha. Só tinha nos sabores "presunto e queijo" e "frango assado" (incrível, não é?). Pois... escolhi então o frango, contrariado (eu, não o frango!!), achando que eu fosse sentir apenas um leve aroma de frango assado, uma lembrança vaga do sabor de um frango assado, um traque de frango assado... mas não! Senti um puta gosto de frango assado na minha batata frita!! Aí eu me perguntei: "Puta que o pariu, porque um sujeito que quer comer uma batata frita compra uma batata frita e tem que sentir gosto de frango assado e não de batata frita? Nunca pensaram na possibilidade do sujeito ir comer um frango assado quando quer sentir o sabor de um frango assado? Não conseguem mais entender que um sujeito que compra e abre um saco de batatas fritas quem comer batatas fritas? Acaso os frangos entraram em extinção? Alguma ONG natureba conseguiu a proibição do assamento de frangos? Será que na fábrica...     Não!! Mil vezes, não!! Não consigo imaginar operários de uma fábrica "high tech" da Elma Chips esfregando frangos assados em batatas fritas!! Não, não..."
Esse mundo prático anda mesmo muito complicado...

Vicente Estevam Júnior
"Cerveja é a prova de que Deus nos ama e quer que sejamos felizes!" (Benjamin Franklin)