quinta-feira, 22 de setembro de 2011

´´Eu não quero ter razão, eu quero ser feliz´´


´´Eu não quero ter razão, eu quero ser feliz´´
Ferreira Gullar

       Antes de começar a ler, lembre-se que não sou escritor, nem filósofo, nem me pretendo assim.
Também não li Sartre, nem Freud, nem Aristóteles, nem Kant como deveria e gostaria. Então
vai aqui apenas uma reflexão bem pessoal, nada catedrática. Eu não quero ter razão. Ou
melhor, eu quero, mas sei que posso não ter.
       Falando em facebuquianês, a frase do título acima eu compartilhei do mural do poeta santista
Flávio Viegas Amoreira e complementei, muito licenciosamente, dizendo que eu acho que isso
não deva ser uma obrigação. Também brinquei num outro post dizendo que sinceramente, sem
hipocrisias, que o que eu queria mesmo eram as duas coisas: ser feliz e ter razão.
       Só que falando bem sério mesmo, a questão tem me preocupado. Não creio que Ferreira
Gullar tenha limitado o termo “razão” ao significado relacionado, por exemplo, a ganhar uma
discussão, ou ser a pessoa que tem os melhores e mais firmes argumentos.
       Será que o “razão” do Gullar não quer dizer siso, consciência? Se for, como eu acredito que
seja, então ele estaria dizendo algo como Raul Seixas, que na sua “Só pra variar” canta “Pena
eu não ser burro... não sofria tanto”, mas mais do que isso, estaria justamente dizendo que a
busca dessa consciência da felicidade é que deixa a pessoa infeliz.
       É isso que eu tenho visto nas pessoas, e que já li no Pondé algumas vezes: atualmente há uma
perseguição ferrenha à tal felicidade. As pessoas querem, e vivem dizendo, dentro ou fora das
redes sociais, que querem ser felizes. Penso que só esse fato já pode fazer a pessoa infeliz.
Essa necessidade de medir as coisas, de SER. Eu creio que a pessoa possa ESTAR feliz, possa
estar numa ótima fase, vivendo belos momentos, pode até se sentir plena, mas absoluta e
eternamente feliz eu duvido que consiga.
       Vamos ver por dois ângulos:
       Se a pessoa diz que quer SER feliz pelos seus próprios parâmetros, individualmente, o que
é mais compreensível, seja uma felicidade burguesa (mais volúvel) ou psíquica (mais íntima
e menos variável) então ela está ignorando fatores externos capazes de, repentinamente,
acabar com essa felicidade, ou seja, ela sempre poderá apenas ESTAR feliz porque isso
possivelmente, e provavelmente, será mesmo efêmero, ainda que por poucos momentos, se a
pessoa der muita sorte. Se for isso, ela jamais SERÁ feliz. O problema é que essa perseguição
é fruto de um grau de comparação que tende sempre, como vimos, à frustração. Daí que ela vai
passar a vida toda frustrada, ou infeliz, porque ainda não alcançou a felicidade. Haverá sempre
um novo desejo...
       Mas digamos que a pessoa é bem mais altruísta e seu sonho de felicidade é um mundo justo,
onde as pessoas sejam todas boas, todas as doenças tenham cura, a natureza não mais sofra na
mão do homem, etc., etc., etc... Tudo certíssimo, como prega o bom-mocismo politicamente
correto atual. E digamos também que num determinado dia um absurdo nas probabilidades
realize essa utopia. Então, todas as pessoas, os animais e o meio ambiente, tudo, será feliz?
Não, ninguém será feliz porque não vai mais haver parâmetro de infelicidade. A vida vai ser o
que é apenas. E ela já é mesmo apenas o que ela é, sentindo-se você feliz ou não nela.
       Portanto, que as pessoas lutem sim pelas suas conquistas e as comemorem; pelos seus amores,
pelos seus prazeres, pelos seus princípios, e que queiram ver suas pessoas queridas e as outras
todas desfrutarem da mesma fortuna, mas que não façam disso um peso sobre os ombros. Que
consigam enxergar e desfrutar mais do que medir. Que não se olhem no espelho como uma
pessoa infeliz, mas como alguém que ainda não está tão feliz como gostaria. Não sejamos
crianças mimadas que têm que ter suas necessidades sempre atendidas para não ficarmos
de beicinho, mas procuremos enxergar com discernimento e naturalidade, que a vida tem
coisas boas, não tão boas, ruins, péssimas, excelentes... mas é pra ser vivida, não mensurada
e avaliada. “A felicidade consiste em ser o que se é", como está no Elogio da Loucura do
Erasmo, o Tremendão de Rotterdam.

Vicente Estevam Junior

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